segunda-feira, 15 de junho de 2015

O VELHO CARISMA


Reproduzo, aqui, o artigo entitulado: "O Velho Carisma", publicado por Selvino Heck. Da conta a uma reflexão sobre o protagonismo da Lomba do Pinheiro, onde o mesmo foi militante das pastorais sociais e movimento populares da região, no decorrer da década de 1970 e dos anos 90.

No mês de maio esteve presente no Curso de Formação para lideranças, organizado pelo Conselho Popular da Lomba do Pinheiro, para mobilizar os participantes para a agenda do PPA. Segue, abaixo, o texto para a boa leitura!

“O VELHO CARISMA
                Felizmente, de vez em quando acontecem coisas na vida da gente que nos rejuvenescem, fazem a vida recuperar sentido e ajudam a renascer/ressignificar a esperança.

                Aproveitando a preparação do Fórum Dialoga Brasil Sul do Plano Plurianual 2016-2019, e sabendo que havia um curso de formação de lideranças na Parada 10 da Lomba do Pinheiro (lá, antes dos nomes das vilas – São Pedro, Bonsucesso, Santa Helena, Panorama, Mapa, dos Herdeiros, Esmeralda -, você sabe a localização através do número da parada do ônibus. Morei muitos anos na parada 13, vila São Pedro, e algum tempo na Parada 12, vila Santa Helena), voltei, com o Zeca (José Vermohlen), companheiro dos bons da Secretaria Geral da Presidência, à Lomba do Pinheiro velha de guerra.

                Reencontrei antigas lideranças ainda no batente, conheci novas. (Re)encontramos freis franciscanos. Na casa onde morei nos anos 1970, Parada 13, vila São Pedro, mora agora Frei Benício Warken, com estudantes de teologia, confrade que não via há muitos anos. Encontrei-o na frente de casa, acompanhado de um jovem estudante de teologia. Estava com uma pequena pá na mão, limpando o gramado, como qualquer morador de folga sábado de tarde.

                No início dos anos 1970, os freis franciscanos resolveram inovar. Frei Arno Reckziegel e outros freis foram morar no meio do povo, em casas de bairros populares da Lomba do Pinheiro. Sem estrutura paroquial, pequenas comunidades de freis. Foram fazer o trabalho de pastoral, com grupos de reflexão da Bíblia, as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). E participar da vida do povo, ajudar na sua luta e organização por direitos, por políticas públicas de saúde, educação, transporte público e assim por diante. Juntei-me à experiência em 1977.

Cléo Bonotto, jovem estudante falecido em estúpido acidente no início de 2014, fez a dissertação no Mestrado de Integração Latino-americana da Universidade Federal de Santa Maria, com o título “Tendo a cruz por bandeira: Movimentos religiosos contra-hegemônicos na América Latina inspirando as histórias da formação e a prática de agentes religiosos em movimentos populares no Rio Grande do Sul (1970-1980)”. Entre outros, entrevistou Frei Arno Reckziegel e a mim sobre a experiência da Lomba do Pinheiro.
O objetivo da dissertação era “compreender os processos de formação e atuação de mediadores religiosos que se engajaram em movimentos sociais no fim da década de 1970 e início da década de 1980, no Estado do Rio Grande do Sul. Tendo em vista que, em plena ditadura militar, na ausência de sindicatos e de partidos políticos atuantes que expressassem os interesses das classes populares, reprimidos ou cooptados pelo regime ditatorial, outras organizações da sociedade civil ocuparam esse espaço, algumas dessas organizações tomaram parte ativa nos conflitos e colocaram-se a serviço das classes populares”.

Sobre a Lomba do Pinheiro, Cléo diz que “é o pioneirismo franciscano na Lomba do Pinheiro: a vida no meio do povo, reaprendendo a ler a Bíblia. A Lomba do Pinheiro serviu como uma espécie de laboratório para a Ordem Franciscana do Rio Grande do Sul, sendo constantemente avaliada pela Província, e serviu de exemplo para outros grupos religiosos e de leigos na inserção em comunidades mais pobres. Para isso, morava-se como e com os mais pobres, não se dependia deles para a própria sobrevivência, trabalhava-se, nem eram mantidas grandes estruturas que pudessem atrapalhar o trabalho de base. Neste sentido, as CEBs, as pequenas comunidades, os grupos de reflexão da Bíblica caíam bem, iam além do oficialismo ou da doutrina, assim como permitiam a participação direta do povo na reflexão e na organização, o que se poderia dizer que era a Teologia da Libertação posta em prática, vivida (Relato de Frei Arno Reckziegel, 2007).”

“A participação dos religiosos na organização das lutas populares na periferia estava baseada no papel de mediadores que desempenhavam a ligação entre uma nova maneira de encarar a religiosidade e a reflexão sobre os problemas concretos da realidade das comunidades e a partir daí incentivavam a organização popular e a formação de lideranças, ‘incentivavam o povo a lutar e a participar destas organizações, ou criar novas. Criou-se a partir daí a União de Vilas da Lomba do Pinheiro, com um jornal próprio e com uma articulação para juntar as diferentes necessidades e leva-las ao poder público ou às empresas de ônibus, por exemplo’ (Depoimento de Selvino Heck, 2007).”

Em 2015, a Lomba cresceu muito em número de população. Mas as comunidades continuam lá, nas mesmas Paradas e vilas. A formação de lideranças continua. Os freis franciscanos continuam morando nas casas no meio do povo, no trabalho de pastoral, de leitura e reflexão da Bíblia e de formação conscientizadora.

O velho carisma não morreu. Está vivo. Assim como há um papa Francisco, que não se chama Francisco por acaso, o novo e o futuro acontecem na simplicidade, no trabalho de base, na educação popular, a fé vivida na realidade do povo que se organiza e constrói o Reino de Deus já neste mundo.

Selvino Heck
Assessor Especial da Secretaria Geral da Presidência da República

Em doze de junho de dois mil e quinze"

Reproduziremos sempre o que entendemos acrescer para o conjunto da população do nosso bairro!

Francisco Geovani de Sousa
Coordenador do Conselho Popular 
da Lomba do Pinheiro

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