Reproduzo, aqui, o artigo entitulado: "O Velho Carisma", publicado por Selvino Heck. Da conta a uma reflexão sobre o protagonismo da Lomba do Pinheiro, onde o mesmo foi militante das pastorais sociais e movimento populares da região, no decorrer da década de 1970 e dos anos 90.
No mês de maio esteve presente no Curso de Formação para lideranças, organizado pelo Conselho Popular da Lomba do Pinheiro, para mobilizar os participantes para a agenda do PPA. Segue, abaixo, o texto para a boa leitura!
“O VELHO CARISMA
Felizmente,
de vez em quando acontecem coisas na vida da gente que nos rejuvenescem, fazem
a vida recuperar sentido e ajudam a renascer/ressignificar a esperança.
Aproveitando
a preparação do Fórum Dialoga Brasil Sul do Plano Plurianual 2016-2019, e
sabendo que havia um curso de formação de lideranças na Parada 10 da Lomba do
Pinheiro (lá, antes dos nomes das vilas – São Pedro, Bonsucesso, Santa Helena,
Panorama, Mapa, dos Herdeiros, Esmeralda -, você sabe a localização através do
número da parada do ônibus. Morei muitos anos na parada 13, vila São Pedro, e
algum tempo na Parada 12, vila Santa Helena), voltei, com o Zeca (José
Vermohlen), companheiro dos bons da Secretaria Geral da Presidência, à Lomba do
Pinheiro velha de guerra.
Reencontrei
antigas lideranças ainda no batente, conheci novas. (Re)encontramos freis
franciscanos. Na casa onde morei nos anos 1970, Parada 13, vila São Pedro, mora
agora Frei Benício Warken, com estudantes de teologia, confrade que não via há
muitos anos. Encontrei-o na frente de casa, acompanhado de um jovem estudante
de teologia. Estava com uma pequena pá na mão, limpando o gramado, como
qualquer morador de folga sábado de tarde.
No
início dos anos 1970, os freis franciscanos resolveram inovar. Frei Arno Reckziegel
e outros freis foram morar no meio do povo, em casas de bairros populares da
Lomba do Pinheiro. Sem estrutura paroquial, pequenas comunidades de freis. Foram
fazer o trabalho de pastoral, com grupos de reflexão da Bíblia, as Comunidades
Eclesiais de Base (CEBs). E participar da vida do povo, ajudar na sua luta e
organização por direitos, por políticas públicas de saúde, educação, transporte
público e assim por diante. Juntei-me à experiência em 1977.
Cléo Bonotto,
jovem estudante falecido em estúpido acidente no início de 2014, fez a
dissertação no Mestrado de Integração Latino-americana da Universidade Federal
de Santa Maria, com o título “Tendo a cruz por bandeira: Movimentos religiosos
contra-hegemônicos na América Latina inspirando as histórias da formação e a
prática de agentes religiosos em movimentos populares no Rio Grande do Sul
(1970-1980)”. Entre outros, entrevistou Frei Arno Reckziegel e a mim sobre a
experiência da Lomba do Pinheiro.
O objetivo da
dissertação era “compreender os processos de formação e atuação de mediadores
religiosos que se engajaram em movimentos sociais no fim da década de 1970 e
início da década de 1980, no Estado do Rio Grande do Sul. Tendo em vista que,
em plena ditadura militar, na ausência de sindicatos e de partidos políticos
atuantes que expressassem os interesses das classes populares, reprimidos ou
cooptados pelo regime ditatorial, outras organizações da sociedade civil
ocuparam esse espaço, algumas dessas organizações tomaram parte ativa nos
conflitos e colocaram-se a serviço das classes populares”.
Sobre a Lomba
do Pinheiro, Cléo diz que “é o pioneirismo franciscano na Lomba do Pinheiro: a
vida no meio do povo, reaprendendo a ler a Bíblia. A Lomba do Pinheiro serviu como
uma espécie de laboratório para a Ordem Franciscana do Rio Grande do Sul, sendo
constantemente avaliada pela Província, e serviu de exemplo para outros grupos
religiosos e de leigos na inserção em comunidades mais pobres. Para isso,
morava-se como e com os mais pobres, não se dependia deles para a própria
sobrevivência, trabalhava-se, nem eram mantidas grandes estruturas que pudessem
atrapalhar o trabalho de base. Neste sentido, as CEBs, as pequenas comunidades,
os grupos de reflexão da Bíblica caíam bem, iam além do oficialismo ou da
doutrina, assim como permitiam a participação direta do povo na reflexão e na
organização, o que se poderia dizer que era a Teologia da Libertação posta em
prática, vivida (Relato de Frei Arno Reckziegel, 2007).”
“A participação
dos religiosos na organização das lutas populares na periferia estava baseada
no papel de mediadores que desempenhavam a ligação entre uma nova maneira de
encarar a religiosidade e a reflexão sobre os problemas concretos da realidade
das comunidades e a partir daí incentivavam a organização popular e a formação
de lideranças, ‘incentivavam o povo a lutar e a participar destas organizações,
ou criar novas. Criou-se a partir daí a União de Vilas da Lomba do Pinheiro,
com um jornal próprio e com uma articulação para juntar as diferentes
necessidades e leva-las ao poder público ou às empresas de ônibus, por exemplo’
(Depoimento de Selvino Heck, 2007).”
Em 2015, a
Lomba cresceu muito em número de população. Mas as comunidades continuam lá,
nas mesmas Paradas e vilas. A formação de lideranças continua. Os freis
franciscanos continuam morando nas casas no meio do povo, no trabalho de
pastoral, de leitura e reflexão da Bíblia e de formação conscientizadora.
O velho
carisma não morreu. Está vivo. Assim como há um papa Francisco, que não se
chama Francisco por acaso, o novo e o futuro acontecem na simplicidade, no
trabalho de base, na educação popular, a fé vivida na realidade do povo que se
organiza e constrói o Reino de Deus já neste mundo.
Selvino
Heck
Assessor
Especial da Secretaria Geral da Presidência da República
Em
doze de junho de dois mil e quinze"
Reproduziremos sempre o que entendemos acrescer para o conjunto da população do nosso bairro!
Francisco Geovani de Sousa
Coordenador do Conselho Popular
da Lomba do Pinheiro
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